
Conheci vários tipos de artistas dedicados ao cinema. O cinema é um castelo de muitas portas e janelas (frase besta). Cada um entra pela sua abertura. Tem gente ligada em temas específicos, tem gente ligada em linguagens específicas, tem gente ligada no ambiente do cinema, no sentido do metier, tem gente, muita, pra quem o cinema pode ser uma forma de ganhar (perder) dinheiro fácil no showbizz, e deve haver muitos outros que não conheço ou não me vêm à mente, agora. Acredito que para todos, em algum momento, a questão se coloque, lá no fundo ou na superfície da consciência: que filme fazer, que história contar?
Poéticas
Nunca vi um tipo de resposta que pudesse dar conta dessa questão, de uma forma genérica e categórica ao mesmo tempo. Bertolt Brecht andou fazendo esta pergunta. Syd Field pretende responder, da sua forma. O Cinema Novo e o Dogma, lá dos dinamarqueses, também. Todas estas respostas, para funcionarem, dependem de um estado de engajamento ou de sintonia prévia entre o sujeito, o artista, o poeta, e seu objeto, a obra. Creio que é exatamente a construção desse objeto que constitui a base de qualquer poética. Primeiro o estabelecimento do nível de relação entre a obra e o mundo. Brecht perguntava se o mundo podia ser representado pelo teatro. Então, embutida na questão dele, se colocava uma tarefa para o teatro, sua missão: representar o mundo.
Para quê fazer cinema?
E o cinema que queremos (ou devemos?) fazer, tem uma missão?
Estou supondo aqui que superamos a etapa narcísica em que "fazer cinema" era um caráter distintivo com que um sujeito "cineasta" se apresentava ao mundo e com isso angariava simpatias e despertava tal curiosidade, que chegava a um lugar de destaque, por diferenciação dos demais. Acho que ainda existe isso, um pouco, em todos nós e em relação ao que fazemos, seja o que for, do cinema à enfermagem, da física nuclear à tornearia mecânica (neste caso, sobretudo, se o sujeito chega à Presidência da República), mas sigamos em frente.
A suposição que fazemos é de que, seja qual for o engajamento poético, haverá princípios a serem levados em conta, por trás da organização do discurso narrativo. Esse princípios não devem ser confundidos com regras ou normas de composição. Regras e normas de composição fazem parte das poéticas e incorporam, entendem ou interpretam, cada uma à sua maneira, os princípios de que queremos falar.
Cognição e efeito estético
Estes princípios, suponho, devem se situar entre as atitudes dos espectadores durante a exibição do filme e a natureza linear e seqüencial com que inevitavelmente os discursos narrativos são apresentados, por força de seus suportes (a película, o vídeo analógico ou digital), e formatos (longametragem, novela de TV, curtametragem, videoclipe...). Nesse encontro se produzem certos enlaces (arriscando, aqui) cognitivos pelos quais o espectador constrói ou completa, internamente, uma imagem de um suposto mundo, real ou imaginário, com supostos espaço e tempo, a partir do discurso narrativo a que foi exposto.
Pois bem, não dá para avançar com um tratado sobre esta questão. Isto é o que, nas Oficinas, começamos a pesquisar. Alguém prossegue, completa ou nega este raciocínio?